Os primeiros dias do comércio eletrônico e dos pagamentos estavam repletos de desafios. A conectividade era limitada, os pagamentos nem sempre funcionavam, a logística demorava muito e a fraude era difícil de detectar e impedir. Os consumidores não tinham certeza de que as pessoas do outro lado do computador realmente entregariam os produtos e serviços oferecidos. Foi uma época de muitas dúvidas sobre se o comércio online era competente ou honesto – em outras palavras, se era confiável.
Nas últimas duas décadas, com a rápida adoção de smartphones e a digitalização global, superamos, em grande parte, as barreiras dos primeiros dias do comércio eletrônico. As tecnologias digitais passaram a rivalizar com a indústria, criaram economias inteiramente novas e transformaram a maneira como trabalhamos, vivemos e consumimos.
Olhando para o futuro, à medida que o comércio e os pagamentos evoluem, dispositivos móveis, big data, inteligência artificial e outros avanços estão mudando todas as faces de nossas vidas. O que imagino que acontecerá nos próximos dez anos? Difícil dizer, pois o mundo evolui de forma exponencial. Mas tenho algumas sugestões que gostaria de dividir com vocês.
O comércio vai se tornar contextual e os pagamentos se tornarão cada vez mais invisíveis
Já vimos uma grande mudança em como e onde o comércio é realizado: antes de 1999, você ia à loja; agora, a loja vai até você. Os anos seguintes viram o aumento acentuado do comércio online e móvel e a criação de novas modalidades, como entretenimento e serviços de assinatura direta ao consumidor. O setor de pagamentos inovou paralelamente a essas mudanças, para permitir que os usuários pagassem por bens e serviços de forma cada vez mais orgânica.
Na próxima fase do comércio, a contínua capacitação de dispositivos embaçará a linha entre consumo, experiências da vida cotidiana e o pagamento por essas experiências. Os comerciantes implementarão tecnologias de pagamento que tornarão o comércio o mais transparente possível. Quer um exemplo? Pense na última vez em que você usou um app de mobilidade. Você pagou quando pediu o carro, quando chegou em casa com segurança ou em algum lugar ao longo do caminho? Pois eu também não me lembro…
A engenhosidade humana ajudará a IA a entender o conceito de “criatividade”
Embora a Inteligência Artificial exista há cerca de 50 anos, a inteligência humana tem cerca de 200 mil anos de vantagem. Com o rápido avanço do machine learning e do deep learning, geralmente se debate se a IA ultrapassará a inteligência humana, que é uma coleção de faculdades intelectuais e emocionais. A IA não tem criatividade, emoção, compaixão ou amor – as coisas que nos tornam exclusivamente humanos.
A IA é a amplificação da criatividade humana, e não algo inatamente criativo. A razão pela qual ensinamos às máquinas o que sabemos é para levá-las onde estão hoje, mas não conseguimos substituir como nos sentimos com o que as máquinas podem fazer. O aprendizado profundo é baseado na modelagem do cérebro humano, e ainda não descobrimos como o cérebro realmente funciona. Ainda não estamos em posição de ensinar a uma máquina como o cérebro trabalha, muito menos a combinação entre cérebro e coração.
Uma criança que está apenas começando a andar é mais capaz de lidar com obstáculos em uma sala do que provavelmente o robô mais tecnológico e caro do mundo – por causa do que se costuma chamar de memória genética. Embora existam coisas que podemos ensinar, também há aquelas que naturalmente distinguem os humanos quando lidam com situações complexas. A IA será capaz de nos substituir em determinadas tarefas, mas há alguns itens próprios da Humanidade que ainda não são possíveis de serem simulados. Para que a inteligência se crie de forma artificial, provavelmente teremos de esperar mais uma década. E, para chegar lá, será necessário encontrar uma maneira ética e responsável para utilizar o mar de dados que temos à disposição.
Não há dúvida de que as empresas envolvidas no comércio de produtos e serviços contam com enormes quantidades de dados e esses dados podem criar diversas oportunidades para novas vendas. Mas essa vantagem só será concretizada se esses lojistas entenderem como coletar esses dados e o que podem fazer com eles. Caso contrário, estaremos diante do que chamamos de “exaustão digital”.
Privacidade e confiança em relação aos dados se tornarão sinônimos
Os consumidores estão fazendo boas perguntas sobre como suas informações pessoais são coletadas, armazenadas e compartilhadas, e demonstrando diferentes visões sobre como definem o conceito de privacidade. Para as famílias que compram online por meio de um computador compartilhado, privacidade pode significar manter um login de navegador exclusivo para garantir que um ente querido não veja, com antecedência, o presente de aniversário, por exemplo. Para o pequeno empresário que deseja começar a aceitar pagamentos com cartão de crédito, privacidade significa o que armazenar e como utilizar os dados dos clientes para crescer o seu negócio. Para certas pessoas, privacidade pode significar saber controlar o quanto os outros sabem sobre elas ou mesmo não serem incomodadas.
A privacidade é pessoal, o que torna ainda mais imperativo que as empresas comprovem transparência a seus clientes sobre como seus dados estão sendo usados. Em vez de apenas cumprir a lei de privacidade, as companhias não terão escolha a não ser lutar para ganhar a confiança dos clientes, tornando a privacidade uma prioridade.
Empresas de todos os setores serão forçadas a reconsiderar a importância dos dados, se elas podem protegê-los e se suas práticas de privacidade de dados são robustas o suficiente para criar confiança. Em alguns casos, como no PayPal, usamos dados para fazer com que nossos produtos funcionem com eficiência e fornecer aos nossos clientes serviços convenientes, seguros e significativos. Isso inclui cookies do navegador e tecnologias similares capazes de reconhecer e verificar os usuários que retornam. Os dados nos ajudam a fechar o ciclo entre velocidade, conveniência e segurança.
A digitalização da moeda ajudará a pavimentar o caminho para a inclusão financeira
Com qualquer grande transformação na indústria do comércio, antes que ela se torne realidade, deve primeiro ser adotada por todo o ecossistema: consumidores, reguladores, parceiros e comerciantes. Isso vale para criptomoedas, moedas virtuais e novas aplicações do blockchain. Todos têm um potencial único e diferente nos setores de comércio e pagamentos.
O blockchain, por exemplo, é conhecido por ter potencial em confiança, identidade, pagamentos e custódia. A aplicação dessa tecnologia como moeda virtual não é apenas uma maneira comprovada de gerenciar e movimentar dinheiro, mas fornece acesso ao ecossistema financeiro sem que haja necessidade de o cliente ter uma conta bancária, algo muito comum em comunidades carentes. E, embora ainda permaneça volátil e questionada em muitos níveis, a criptomoeda é elogiada por seu anonimato e viabilidade, como um ativo fora da infraestrutura financeira tradicional.
A digitalização da moeda é apenas uma questão de “se”, não de “quando”. Nesta nova década, a moeda se tornará mais digitalizada e provavelmente experimentará maior apoio de fintechs, governos e reguladores. Porém, o mais importante é que, para que as moedas digitais sejam adotadas pelos consumidores, estes devem sentir que elas são um método seguro e conveniente de se envolver no ecossistema financeiro. Caso contrário, a moeda digital não se tornará tão grande nos próximos anos.